Quando somos pequenos, principalmente as meninas, tendemos a imaginar a nossa vida futura como um romance cor-de-rosa. Mesmo quando chegámos à tão malograda fase da adolescência, com as hormonas descontroladas, guardámos sempre num cantinho do coração aquelas horas que passamos a idealizar o príncipe encantado, a imaginar a casa em que viveríamos, uma grande mansão, com piscina e tudo o que nos agrade à imaginação. Pelo menos foi assim que aconteceu comigo, nunca parei de idealizar, de almejar conhecer o meu principie encantado e viver feliz para sempre com ele num casarão, cheia de filhos e gatos.
Depois, lá chega a altura em que nos apaixonámos, em que o amor nos inebria e a paixão nos tolda a mente. Durante os primeiros meses em que nos deixamos envolver nada nem ninguém existe. Apenas nós e a nossa felicidade louca e a sensação de que somos invencíveis.
E a vida segue o seu curso natural, se forem felizardos o suficiente, em conjunto com a vossa cara-metade. Foi o que aconteceu comigo. Às vezes ainda me preenche aquele sentimento de irrealidade, será que vou ser sempre assim tãaao feliz? Será que com o tempo esta sensação de furor, de êxtase vai amainar? Porque quando somos abençoados com a dádiva de um amor assim tão doce, leva uns tempos a acreditar. E quem quer saber se a mansão se transforma num T1 ou se o príncipe encantado ressona durante a noite se de manhã acordam com um poema assim na vossa mesinha de cabeceira....
Não estejas longe de mim um dia que seja, porque,
porque, não sei dizê-lo, é longo o dia,
e estarei à tua espera como nas estações
quando em algum sitio os comboios adormeceram.
Não te afastes uma hora porque então
nessa hora se juntam as gotas da insónia
e talvez o fumo que anda à procura de casa
venha matar ainda meu coração perdido.
Ai que não se quebre a tua silhueta na areia,
ai que na ausência as tuas pálpebras não voem:
não te vás por um minuto, ó bem-amada,
porque nesse minuto terás ido tão longe
que atravessarei a terra inteira perguntando
se voltarás ou me deixarás morrer.
Pablo Neruda, in "Cem Sonetos de Amor"